Onconews - Uso de corticosteroides afeta eficácia da imunoterapia

TABAK NET OK 2Estudo de Arbour et al publicado no JCO mostra que o efeito imunossupressor dos corticosteroides pode reduzir a eficácia do bloqueio anti PD-L1, com impacto nos desfechos de sobrevida global e sobrevida livre de progressão. O onco-hematologista Daniel Tabak (foto), diretor-médico do Centro de Tratamento Oncológico (CENTRON), no Rio de Janeiro, analisa os resultados.

 

Neste estudo, os pesquisadores usaram dados do mundo real para examinar o efeito dos corticosteroides no início do tratamento. Pacientes com carcinoma de pulmão não-pequenas células de duas instituições - Memorial Sloan Kettering Cancer Center e Gustave Roussy Cancer Center - foram tratados com um único inibidor de PD-L1. Os registros clínicos e de farmácia foram revisados ​​para identificar o uso de corticosteroides no início da terapia anti – PDL1.

Os autores descrevem que 90 (14%) dos 640 pacientes tratados com anti PD- (L)1 receberam corticosteroides equivalentes a ≥ 10 mg de prednisona diariamente no início do tratamento com imunoterapia. Indicações comuns para corticosteroides foram dispneia (33%), fadiga (21%) e metástases cerebrais (19%). Em ambas as coortes independentes, Memorial Sloan Kettering Cancer Center (n = 455) e Gustave Roussy Cancer Center (n = 185), os corticosteroides usados no início do tratamento foram associados com a diminuição da taxa de resposta global, sobrevida livre de progressão e sobrevida global com bloqueio de PD-L1.

Na análise multivariada que considerou as duas coortes agrupada, ajustando-se a história de tabagismo, status de desempenho e história de metástases cerebrais, os corticosteroides permaneceram significativamente associados à menor sobrevida livre de progressão (hazard ratio, 1,3; P = 0,03) e sobrevida global (hazard ratio, 1,7; P <0,001).

Em conclusão, o uso de corticosteroides basal de ≥ 10 mg de prednisona foi associado a desfechos mais desfavoráveis ​​em pacientes com câncer de pulmão não-pequenas células tratados com bloqueio PD-L 1. “Recomenda-se o uso prudente de corticosteroides no momento de iniciar o bloqueio PD-L1”, alertam os autores.

Importância clínica

Por Daniel Tabak

Em um estudo recente publicado no Journal of Clinical Oncology, pesquisadores na França e nos EUA demonstraram o efeito negativo do uso de corticosteróides em pacientes portadores de câncer de pulmão não pequenas células metastático e que foram submetidos ao tratamento com os inibidores de checkpoint atezolizumabe e pembrolizumabe.

As doses de corticosteróides utilizadas, superiores ao equivalente de 10 mg de prednisona diária, determinaram uma taxa de resposta inferior no que tange a sobrevida de livre de progressão (SLP) e sobrevida global (SG). No grupo de pacientes tratados no Memorial Sloan-Kettering Cancer Center (MSKCC), a SLP mediana foi reduzida de 2.6 meses para 1.9 meses, com um valor de p=0.001. O efeito na SG mediana foi ainda mais evidente: a redução de 12.1 meses para 5.4 meses foi também estatisticamente significativa. Nos pacientes tratados na França os números foram semelhantes.

Estes dados são relevantes diante da sua importância clínica, apesar do número limitado de pacientes nos quais o efeito foi documentado. O número de pacientes tratado com esses agentes cresce diariamente, bem como a abrangência de suas indicações. A preocupação com os resultados do estudo é real diante dos efeitos colaterais evidenciados pelos inibidores de checkpoint.

Corticosteróides são frequentemente utilizados, principalmente diante da impressão de que estes agentes não interferem no seu efeito terapêutico em pacientes portadores de melanoma.

Pacientes tratados com inibidores de checkpoint frequentemente apresentam doença avançada e a presença de metástases cerebrais determina habitualmente a utilização de doses elevadas de corticosteróides. No estudo americano, o efeito negativo dos esteróides em pacientes que interromperam o seu uso no mês anterior à introdução dos imunomoduladores foi minimizado.

O estudo acrescenta novas incertezas no uso dos agentes que modificaram a prática oncológica nos últimos anos. A documentação do fenômeno de progressão acelerada em pacientes tratados com os novos agentes imunoterápicos, bem como a pseudoprogressão da doença metastática, refletem a necessidade do seu uso criterioso e cuidado no seu manuseio. A análise, também recente, do efeito negativo da utilização de antibióticos em paciente portadores de carcinoma de pulmão, carcinoma renal e melanoma metastático revela a complexidade na análise das respostas terapêuticas.

Os mecanismos de ação não foram avaliados. Entretanto, diversos estudos demonstram a importância dos agentes efetores - linfócitos CD8+ - e da microbiota na modulação dos efeitos dos inibidores de checkpoint.

O estudo publicado, entretanto, apresenta diversas limitações. Diante de uma análise retrospectiva, vários aspectos precisam ser ressaltados. O número de pacientes portadores de metástases cerebrais e o maior volume tumoral no grupo de pacientes tratados com esteróides pode ter influenciado os resultados. A utilização dos inibidores de checkpoint em diversas fases do tratamento - primeira ou segunda linha - e após o uso de outros agentes imunomoduladores também pode ter comprometido a interpretação do estudo.

Estes vieses, no entanto, não invalidam a importância clínica do estudo que documentou mais um fator relevante na análise dos resultados terapêuticos em pacientes tratados com agentes anti-PD1 e anti-PDL1.

Referência:Impact of Baseline Steroids on Efficacy of Programmed Cell Death-1 and Programmed Death-Ligand 1 Blockade in Patients With Non–Small-Cell Lung Cancer - Kathryn C. Arbour, Laura Mezquita, Niamh Long, Hira Rizvi, Edouard Auclin, Andy Ni, Gala Martínez-Bernal, Roberto Ferrara, W. Victoria Lai, Lizza E.L. Hendriks, Joshua K. Sabari, Caroline Caramella, Andrew J. Plodkowski, Darragh Halpenny, Jamie E. Chaft, David Planchard, Gregory J. Riely, Benjamin Besse, and Matthew D. Hellmann - DOI: 10.1200/JCO.2018.79.0006 Journal of Clinical Oncology