Publicado no JCO Global Oncology, artigo de revisão realizado por pesquisadores do ICESP e da FMUSP traça um panorama do carcinoma hepatocelular no Brasil, analisando o contexto geral de saúde e as particularidades regionais para contribuir com a implementação de medidas que possam melhorar os resultados dos pacientes no país. Leonardo Fonseca (na foto, à direita) é o primeiro autor do trabalho, que tem o professor Flair Carrilho como autor sênior.
O carcinoma hepatocelular (CHC) é a forma mais comum de tumor primário maligno hepático e resulta em aproximadamente 800 mil mortes por ano em todo o mundo. O CHC é frequentemente associado a doenças hepáticas subjacentes, particularmente cirrose causada pelo vírus da hepatite B viral crônica (HBV) e hepatite C vírus (HCV), alcoolismo ou doença hepática gordurosa associada à disfunção metabólica.
“É esperado aumento importante de novos casos de CHC mundialmente, com estimativa de aumento de 55% até 2040. Por outro lado, o prognóstico do CHC pode ser impactado positivamente com a melhor capacidade de diagnóstico precoce e disponibilidade de tratamentos efetivos em todos os estadiamentos”, afirmam os autores.
“Variações geográficas na epidemiologia e fatores de risco, como hepatite viral e doença metabólica, representam desafios na adoção de programas de detecção precoce e manejo de pacientes com CHC. Os programas de monitoramento e triagem de fatores de risco são prioridades não atendidas porque os pacientes geralmente são diagnosticados em estágios avançados”, acrescentam.
Os pesquisadores observam que nos últimos anos houve avanços no manejo de pacientes com CHC, incluindo novas ferramentas para selecionar pacientes para transplante de fígado, técnicas cirúrgicas sofisticadas e novos agentes sistêmicos. Ressecção, ablação e transplante são terapias disponíveis com intenção curativa, enquanto novos tratamentos sistêmicos estão sendo incorporados para o estágio avançado. No entanto, há desigualdade na disponibilidade de tratamentos de alta complexidade.
Centros acadêmicos de alto volume muitas vezes alcançam resultados favoráveis com a adoção e aplicação de tratamentos estabelecidos, mas essa não é uma realidade na maioria das regiões do Brasil, devido às disparidades de riqueza e recursos. “Como o manejo do CHC requer uma equipe coordenada e multidisciplinar, o papel dos centros de referência locais na descentralização do acesso aos tratamentos e na promoção da educação em saúde nas diferentes regiões deve ser incentivado e apoiado”, avaliam.
Em síntese, a compilação dos dados mostra que o CHC é um problema de saúde pública que merece atenção. Atualmente, o prognóstico da doença não é favorável na maioria dos casos no Brasil, pois normalmente a doença é diagnosticada em estágios mais avançados. No entanto, a letalidade do CHC pode ser reduzida por meio de programas de monitoramento,triagem de fatores de risco e políticas de prevenção. Os pesquisadores apontam que existe uma lacuna no setor de educação em saúde pública no Brasil, havendo a necessidade de conscientizar a população de alto risco sobre a importância de realizar exames de ultrassonografia e alfa fetoproteína (AFP) a cada 6 meses para monitorar o desenvolvimento do carcinoma hepatocelular.
“A implementação de novas políticas de prevenção e tecnologias em saúde pode mudar o cenário do carcinoma hepatocelular no Brasil. Além disso, é fundamental criar sistemas de informação para notificar os casos de CHC, estimular seu uso e desenvolver programas de comunicação entre a atenção primária e terciária (alta complexidade). O carcinoma hepatocelular apresenta alta taxa de mortalidade e sobrecarga de custos para os sistemas de saúde, tanto no setor público quanto no privado”, destacam os autores.
“Pacientes com doença potencialmente curável devem ser considerados para terapias cirúrgicas (como transplante e ressecção) ou terapias ablativas (incluindo modalidades percutâneas e radioterápicas). Os pacientes com doença avançada são candidatos a terapias sistêmicas, para os quais o cenário tem evoluído com a incorporação de agentes imunoterápicos e drogas-alvo. Entretanto, é grande o desafio para que todos estes tratamentos estejam amplamente disponíveis em nosso país. Neste sentido, são importantes medidas para melhorar o acesso e a integração dos níveis de atenção”, concluem.
Os médicos Andre Chen, Irai de Oliveira, Aline Chagas e Jaime Kruger são coautores do trabalho.
Referências: Brazilian Landscape of Hepatocellular Carcinoma - Leonardo G. Fonseca, MD; Andre T.C. Chen, MD, PhD; Irai S. de Oliveira, MD; Aline L. Chagas, MD, PhD; Jaime A.P. Kruger, MD, PhD; and Flair J. Carrilho, MD, PhD. DOI: 10.1200/GO.22.00416 JCO Global Oncology no. 9 (2023) e2200416. Published online June 22, 2023. PMID: 37348031