Estudo de coorte que avaliou mais de 26 mil pacientes com câncer de próstata de alto risco em um seguimento mediano de 8,16 anos concluiu que a radioterapia adjuvante deve ser considerada em homens com câncer de próstata com estadiamento T3/4, com linfonodos pélvicos positivos (pN1) ou escore de Gleason de 8 a 10, impactando significativamente na redução do risco de mortalidade. Os resultados estão em artigo de Anthony V. D´Amico e colegas, no Journal of Clinical Oncology (JCO), em acesso aberto. “Este estudo não somente é provocativo, como retrata bem que há que se escolher quem vai se beneficiar de radioterapia adjuvante ou de resgate”, analisa Rodrigo Hanriot (foto), coordenador do Serviço de Radioterapia do Hospital Alemão Oswaldo Cruz.
A radioterapia adjuvante após a prostatectomia radical (PR) não demonstrou reduzir a sobrevida livre de progressão na comparação com a radioterapia de resgate precoce, como apontam ensaios clínicos randomizados. No entanto, homens com doença adversa estavam sub-representados nessa base de evidências, o que motivou os pesquisadores a um novo olhar sobre essa população.
Nesta análise, Anthony V. D'Amico e colegas avaliaram o impacto da radioterapia adjuvante versus radioterapia de salvamento (sRT) precoce no risco de mortalidade por todas as causas em homens com patologia adversa, definida como o câncer de próstata com linfonodos pélvicos positivos (pN1) ou escore de Gleason 8-10 e doença que se estende além da próstata (pT3/4).
Após acompanhamento médio (intervalo interquartil) de 8,16 (6,00-12,10) anos, dos 26.118 homens na coorte avaliada, 2.104 (8,06%) morreram, 539 (25,62%) em decorrência do câncer de próstata. Depois de excluir homens com PSA persistente, o tratamento adjuvante em comparação com sRT inicial foi associado a um risco de morte por todas as causas significativamente menor entre os homens com patologia adversa após prostatectomia radical, mesmo quando a população pN1 foi excluída (0,33 [0,13-0,85]; P = 0,02) ou incluída (0,66 [0,44-0,99]; P = 0,04) na análise.
Em conclusão, esses resultados mostram que a radioterapia adjuvante deve ser considerada em homens com câncer de próstata estádio clínico T3/4, com doença pN1 ou escore de Gleason de 8 a 10, com potencial da reduzir significativamente o risco de morte.
Segundo Hanriot, os três primeiros estudos (antigos e com bias importantes - SWOG, ARO-92 e EORTC) haviam demonstrado ganho em sobrevida livre de recidiva, sendo sobrevida global somente o primeiro. Posteriormente, este benefício foi questionado pelos estudos TROG 08.03 e RAVES, que demonstraram que resgate precoce era igual a radioterapia adjuvante.
“Um dado sempre pôs em dúvida estes extremos de conduta. O estudo de um marcador genômico chamado Decipher, que analisa segmento de 22 perfis de RNA, e que demonstrava três subclasses de risco - baixo, intermediário e alto risco - e com taxas de recidiva e metástases proporcionalmente progressivas entre elas. Curiosamente, somente no subgrupo de alto risco genômico a utilização de radioterapia adjuvante apresentava benefício, com redução de metástases de 23% para 6%, com p<0,01. E na subanálise do Decipher, a vasta maioria do subgrupo de alto risco era composto por Gleason 9-10, e parte com Gleason 8, não havendo nenhum alto risco com Gleason 6 e 72, esclarece o radio-oncologista.
O especialista observa que abrindo os dados do RAVES e TROG, cerca de 85% da população de ambos era Gleason 6-7, predizendo que a radioterapia adjuvante não seria diferente da radioterapia de resgate. “Agora vem a publicação de D`Amico e cols. evidenciando benefício de radioterapia adjuvante exatamente na população com Gleason 8-10, independente do status linfonodal acometido”, afirma.
“Pensando na dificuldade de utilização em massa de testes genômicos para uma população operada e com fatores de risco de recidiva (pT3, margem positiva, etc), a seleção dos candidatos que podem se beneficiar de radioterapia adjuvante baseada em características fenotípicas é um grande passo, restando o teste genômico para diferenciar os Gleason 8 de baixo e alto risco”, conclui Hanriot.
Referências:
1 - Adjuvant Versus Early Salvage Radiation Therapy for Men at High Risk for Recurrence Following Radical Prostatectomy for Prostate Cancer and the Risk of Death - Derya Tilki, MD; Anthony V. D'Amico, MD, PhD et al - DOI: 10.1200/JCO.20.03714 Journal of Clinical Oncology 39, no. 20 (July 10, 2021) 2284-2293. - Published online June 04, 2021.
2 - Den RB, Yousefi K, Trabulsi E et al. Genomic classifier identifies men with adverse pathology after radical prostatectomy who benefit from adjuvant radiation therapy. J Clin Oncol 2015;33(8)944-5