Onconews - ReCisTT: estudo detalha toxicidade da radioquimioterapia com cisplatina no carcinoma espinocelular de cabeça e pescoço

Os brasileiros Gilberto Castro (na foto, à esquerda) e Thiago Bueno de Oliveira (à direita) são coautores de estudo retrospectivo que avaliou a toxicidade do tratamento com cisplatina mais radioterapia em pacientes com carcinoma espinocelular localmente avançado de cabeça e pescoço. “Apesar da alta conformidade com o tratamento, 62,6% dos eventos adversos relatados foram relacionados à cisplatina. Identificar fatores de risco associados à não conformidade pode permitir a identificação de pacientes inelegíveis para radioquimioterapia baseada em cisplatina, evitando que recebam tratamento inadequado que leve a eventos adversos graves”, analisam os autores.

O carcinoma espinocelular localmente avançado de cabeça e pescoço (SCCHN, das iniciais em inglês) é descrito como uma doença multifatorial que envolve fatores genéticos e ambientais, representando uma das causas mais frequentes de morte relacionadas ao câncer em todo o mundo. O uso de tabaco e álcool é responsável pela maioria dos SCCHN, enquanto um número crescente de casos de câncer de orofaringe está associado à infecção pelo papilomavírus humano (HPV).

Neste estudo (ReCisTT), os autores lembram que, apesar das melhorias na sobrevida, os pacientes com SCCHN localmente avançado (LA) HPV-negativo continuam a ter um prognóstico ruim. Para esses pacientes, o padrão de tratamento é a radioterapia com quimioterapia concomitante (RCT), a radioquimioterapia.

Com o objetivo de avaliar a toxicidade do tratamento com RCT, este estudo retrospectivo, multicêntrico e observacional analisou a adesão ao tratamento de 326 pacientes com LA-SCCHN que foram submetidos a RCT entre 1º de janeiro de 2014 e 30 de junho de 2017. Os pesquisadores também avaliaram os fatores associados à adesão, o impacto da adesão na resposta clínica e as principais toxicidades experimentadas pelos pacientes.

Os participantes do estudo eram majoritariamente do sexo masculino (86,2%), com idade mediana de 63,0 anos (DP± 8,9). Quase metade dos pacientes inscritos eram fumantes (48,5%) e 55,8% consumiam álcool pelo menos cinco vezes por semana. Entre os pacientes que realizaram o teste de HPV (16,3%) e cujos dados estavam disponíveis (92,5%), 63,3% testaram positivo. A localização mais comum do tumor foi a orofaringe (44,8%), seguida pela laringe (21,8%) e hipofaringe (20,2%).

Os resultados relatados na Frontiers in Oncology revelam que um total de 274 (84%) pacientes estavam em conformidade e receberam a dose planejada de cisplatina. Durante o estudo, foram relatados 957 eventos adversos (EAs) em 98,2% dos pacientes. A taxa de resposta global foi de 80,2% e 60,4% dos pacientes atingiram resposta completa.

A análise mostra que 62,6% (n = 599) dos EAs relatados foram relacionados à cisplatina. Do total de EAs relatados, 74,1% (n= 709) foram leves a moderados (grau 1-2), 23,2% (n= 222) foram grau 3 e 2,3% (n= 22) foram grau 4. Eventos adversos graves foram registrados em 8,4% (n= 80) e 75,0% (n= 60) foram relacionados à cisplatina. Os EAs mais comuns relacionados à cisplatina durante a RT foram mucosite oral (26,6%, n= 159), náusea e vômito (16,1%, n= 97) e neutropenia (7,7%, n= 46). Além disso, 43 (7,2%) EAs foram relacionados à função renal prejudicada.

“A análise de regressão multivariada mostrou que o performance status (PS) ECOG foi o único fator independentemente associado à adesão ao tratamento com cisplatina durante o RCT (ECOG PS 2 HR: 0,135 [IC 95%: 0,35 - 0,528]; p = 0,004), destacando que os pacientes que tiveram um ECOG PS de 2 tiveram menos probabilidade de serem aderentes ao RCT baseado em cisplatina”, analisam os autores.

Em síntese, este estudo revelou que pacientes com LA-SCCHN atingiram alta taxa de adesão com cisplatina administrada concomitantemente com RT, o que foi afetado negativamente pelo PS ECOG ruim, demonstrando, ainda, que a não adesão pode estar associada a uma resposta tumoral menor.

Além de Gilberto Castro Júnior, oncologista do ICESP e do Centro de Oncologia do Hospital Sírio Libanês, e Thiago Bueno de Oliveira, do AC Camargo Cancer Center, o estudo tem a participação da oncologista Ana Varges Gomes (Centro Hospitalar Universitário do Algarve,  Portugal), que assina como primeira autora, Ana Medina Colmenero (Centro Oncológico de Galicia, Espanha), Leonor Ribeiro (Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte – Hospital Santa Maria, Lisboa, Portugal), Amanda Psyrri (Attikon General University Hospital de Atenas e National and Kapodistrian University de Atenas, Grécia), Nicolas Magné (Departamento de Radioterapia do Institut Bergonié, Bordeaux, França), Maria Plana Serrahima (Institut Català d’Oncologia-Hospitalet, Instituto de Investigación Biomédica de Bellvitge (IDIBELL), Barcelona, Espanha), Joana Marinho ( Centro Hospitalar Vila Nova de Gaia/Espinho, Portugal), Raul Giglio (Instituto de Oncología Ángel H. Roffo, Universidade de Buenos Aires, Argentina), Leticia Iglesias Rey (Departamento de Oncologia Médica, Complexo Hospitalar Universitário de Ourense, Espanha), Martín Angel (Instituto Alexander Fleming, Buenos Aires, Argentina) e Ana M. Macedo (Departamento de Ciências Biomédicas e Evidência Médica, Lisboa, e Faculdade de Medicina e Ciências Biomédicas, Universidade do Algarve, Faro, Portugal).

A íntegra do artigo original está disponível na Frontiers in Oncology.

Referência:           

Front. Oncol., 13 October 2024
Sec. Head and Neck Cancer
Volume 14 - 2024 | https://doi.org/10.3389/fonc.2024.1220640