Onconews - Resultados relatados pelo paciente: análise compara técnica de radioterapia 4D e RT padrão no câncer de pulmão

Poiset et al. analisam os resultados relatados pelos pacientes (PROs), comparando a prevenção funcional baseada na tomografia computadorizada quadridimensional (4DCT), também conhecida como técnica de radioterapia 4D, com os padrões históricos de radioterapia no câncer de pulmão. "Esse conceito é muito interessante e precisa ser melhor estudado para sua aplicação", avalia o radio-oncologista Rodrigo Hanriot (foto), diretor do Departamento de Radioterapia do Hospital Alemão Oswaldo Cruz.

Novos métodos geram imagens funcionais usando técnicas de processamento de imagem combinadas com dados de tomografia computadorizada quadridimensional (ventilação 4DCT). A ventilação 4DCT foi implementada em um ensaio clínico multicêntrico de fase II de prevenção funcional no câncer de pulmão.

O estudo inscreveu pacientes com câncer de pulmão localmente avançado submetidos à quimiorradiação com intenção curativa. Imagens de ventilação 4DCT foram geradas e planos de tratamento de prevenção funcional criaram uma dose reduzida de irradiação para o pulmão. Os instrumentos PRO (Patient- Reported Outcomes) incluíram o questionário Functional Assessment of Cancer Therapy Lung e as subescalas que o acompanham (incluindo o Trial Outcome Index -TOI), EuroQol-5 Dimension -EQ-5D) e EQ-Visual Analog Scale - EQ-VAS). Foram calculadas as mudanças médias da linha de base e a porcentagem de declínios clinicamente significativos. Os resultados foram comparados com os PROs dos estudos RTOG 0617 e PACIFIC usando testes t de Student e testes qui-quadrado.

Os resultados relatados no JCO Clinical Cancer Informatics mostram que 59 pacientes completaram as pesquisas de PRO na linha de base. A idade média foi de 65 anos (44-86), o câncer de pulmão de células não pequenas compreendeu 83% dos casos e a dose média foi de 60 Gy em 30 frações. A porcentagem de pacientes com declínio clinicamente significativo no FACT-TOI em 12 meses foi de 47,8% no RTOG 0617 e de 26,8% no grupo tratado com prevenção funcional (P = 0,03). A coorte de prevenção funcional demonstrou uma mudança significativamente (P = 0,012) maior na pontuação EQ-VAS em 12 meses (9,9 ± 3,3; média ± EP) em comparação com a coorte PACIFIC (1,6 ± 0,6).

“O trabalho atual demonstra PROs aprimorados de um ensaio de prevenção funcional de fase II em certas subescalas (FACT-TOI e EQ-VAS) em comparação com PROs de estudos seminais (RTOG 0617 e PACIFIC)”, concluem os autores, acrescentando que os dados apresentados dão suporte para avaliar a prevenção funcional 4DCT em um cenário de fase III.

A íntegra do artigo está disponível em acesso aberto.

O estudo em contexto

Por Rodrigo Hanriot, radio-oncologista e diretor do Departamento de Radioterapia do Hospital Alemão Oswaldo Cruz

O artigo prospectivo fase II reportado por Spencer Poiset et al traz um conceito novo e potencialmente interessante: fazer um mapeamento funcional do pulmão em imagens 4D e analisar regiões do pulmão com melhor perfusão e troca gasosa, bem como outras com pior perfusão. O objetivo é evitar que os campos de radioterapia atravessem justamente as áreas melhor perfundidas, minimizando perdas funcionais futuras.

A imagem abaixo diz muito sobre isto e é quase autoexplicativa:

4d hanriot

A imagem mostra áreas em vermelho com melhor perfusão e em azul escuro aquelas com maior déficit ventilatório. A linha em vermelho mostra a região do tumor e áreas de baixa ventilação ao redor.

Mapeando o pulmão dessa forma, poderíamos evitar que a composição de campos da radioterapia atravessem áreas de melhor perfusão, minimizando as perdas pulmonares e funcionais futuras. Esse conceito é muito interessante e precisa ser melhor estudado para sua aplicação.

Para tentar demonstrar seu benefício, os autores compararam prospectivamente 58 pacientes neste estudo, que seriam tratados por neoplasia avançada de pulmão, e compararam seus resultados funcionais imediatos, após três e 12 meses, com os observados nos trials RTOG 0617 e PACIFIC. O benefício na utilização da proteção funcional foi compravado somente na análise de 12 meses.

Porém, e sempre há um quando se analisa um artigo, neste estudo TODOS os pacientes foram tratados com IMRT, técnica empregada em somente 43% dos pacientes do RTOG 0617 e que em análise post-hoc demonstrou redução em toxicidade pulmonar e cardíaca quando do uso do IMRT. Além disso, somente 29,3% dos pacientes receberam IMRT com imunoterapia, esta última avaliada pelo trial PACIFIC e sabidamente associada a maiores taxas de pneumonite, especialmente em longo prazo, o que talvez explique melhores desfechos em somente 12 meses.

Avançando um pouco mais, somente 63% dos pacientes com neoplasias não pequenas células receberam dose adequada de pelo menos 60Gy, sendo que doses acima de 60Gy, segundo o RTOG 0617, estavam associadas a maior toxicidade; portanto, 27% das doses abaixo de 60Gy certamente gerarão menor toxicidade (e perigosamente menor controle loco-regional).

Os autores concluíram corretamente que a técnica inovadora e os resultados gerados podem servir de base para estudos prospectivos fase III mais complexos e completos em sua análise.

Referência: 

Spencer J. Poiset et al., Patient-Reported Outcomes: Comparing Functional Avoidance and Standard Thoracic Radiation Therapy in Lung Cancer. JCO Clin Cancer Inform 9, e2400202(2025). DOI:10.1200/CCI-24-00202