Dirce Maria Carraro (foto), do A C Camargo Cancer Center, é autora sênior de estudo que buscou analisar os padrões de recorrência e metástases de pacientes com câncer de mama triplo negativo diagnosticados em pacientes portadores de variantes patogênicas de BRCA1 ou BRCA2 e pacientes não portadoras. Os resultados foram publicados no Cancer Medicine e mostram que, na coorte avaliada, esses pacientes apresentaram maior frequência de metástases ósseas e do sistema nervoso central (SNC) no curso da doença. O trabalho tem a participação de Marcelo Moreno e Júlia Salles Oliveira, que dividem a primeira autoria, além de Rafael Brianese, Douglas Guedes de Castro, Solange Sanches, Giovana Tardin Torrezan, Karina Miranda Santiago, Marina De Brot, Vladmir Cordeiro de Lima, Fabiana Baroni A. Makdissi, Jose Claudio Casali da Rocha e Vinicius Calsavara.
O câncer de mama triplo negativo (TNBC, da sigla em inglês) é a neoplasia mais associada às variantes patogênicas germinativas BRCA1 e tem maior probabilidade de desenvolver metástases do que os outros subtipos de câncer de mama, principalmente nos pulmões e no sistema nervoso central (SNC). Recentemente, estudos que avaliaram o padrão de metástases em pacientes de câncer de mama de qualquer subtipo molecular observaram que as portadoras de BRCA2 apresentavam risco maior de desenvolver metástases no SNC, mas os padrões de recorrência e metástases de pacientes com TNBC e BRCA2 eram desconhecidos.
Neste estudo, os pesquisadores avaliaram uma série de pacientes com diagnóstico de TNBC atendidos no A.C. Camargo Cancer Center, de 1998 a 2020, e com resultados de testes genéticos BRCA1/2 obtidos de prontuários ou realizados para o estudo. Modelos de regressão logística multivariada foram ajustados aos dados para avaliar os fatores independentes para metástases ósseas e do SNC. O ajuste foi feito usando todas as variáveis independentes com p < 0,2 no modelo univariado de Cox para descrever a relação entre as variáveis independentes até o momento da morte.
Os resultados de Carraro e colegas mostram que 388 pacientes com TNBC foram avaliados. Desse total, variantes patogênicas foram identificadas nos genes BRCA1/2 em 21% (82/388), sendo 17,7% (69/388) em BRCA1 e apenas 3,3% (13/388) em BRCA2. Um total de 120 pacientes (31%) desenvolveu metástases à distância. Metástases ósseas ou do SNC foram observadas em 40% e 60% dos portadores de BRCA2 (p = 0,155), respectivamente, mostrando uma padrão diferente do que as demais pacientes.
Os autores descrevem que portadores de BRCA2 tendem a ter maior probabilidade de desenvolver metástases ósseas (OR, 4,06; 95% CI, 0,82–20,01; p = 0,085), quando comparados aos portadores de BRCA1 (OR, 0,6; 95% CI, 0,12–2,87; p = 0,528). Os portadores de BRCA2 tiveram OR de 1,75 (95% CI, 0,33–9,14; p = 0,503) para o desenvolvimento de metástases no SNC, enquanto os portadores de BRCA1 tiveram OR de 0,72 (95% CI, 0,23–2,23; p = 0,574).
“Pacientes com câncer de mama triplo negativo e variante patogênica no gene BRCA2 apresentaram maior frequência de acometimento secundário do osso e do SNC no curso da doença. No entanto, a variante patogênica BRCA2 não representou um preditor independente de metástases e sobrevida global”, afirmam os autores, acrescentando que esforços para aumentar o número de portadores de BRCA2 entre pacientes TNBC são cruciais para determinar seu risco de desenvolver metástases ósseas e do SNC em comparação com não portadores de BRCA2.
“O próximo passo é realizar um estudo multicêntrico para obter mais casos de pacientes com TNBC e BRCA2 mutado, que é um grupo muito raro, para ter um resultado mais robusto do risco dessas mulheres”, conclui Dirce.
O câncer de mama triplo negativo representa cerca de 15% dos casos de câncer de mama e afeta frequentemente mulheres jovens (<40 anos), com predominância entre mulheres afrodescendentes nos Estados Unidos.
A íntegra do estudo está disponível em acesso aberto.
Referência: Moreno M, Oliveira JS, Brianese RC, et al. Risk of metastasis in BRCA2carriers diagnosed with triple-negative breast cancer. Cancer Med. 2023;00:1-13. doi:10.1002/cam4.6267