Pesquisadores pedem mais flexibilidade nos critérios de exclusão em pesquisa clínica e reacendem o debate sobre segurança do paciente participante de pesquisa. O assunto ganhou as páginas da Nature (Cancer researchers push to relax rules for clinical trials)1 e dividiu espaço com a necessária reflexão de risco e do papel de pesquisadores e companhias farmacêuticas em garantir a segurança do participante de pesquisa.
Um dos argumentos para flexibilizar os critérios de exclusão em estudos clínicos sustenta que cerca de 20% dos ensaios nos Estados Unidos falham por não alcançar o número necessário de pacientes. O grupo deve se reunir com autoridades do FDA dia 16 de abril e considera restritivos os critérios de elegibilidade dos estudos clínicos. A pergunta que não quer calar é como fica a segurança do participante de pesquisa?
Em março, uma mulher com câncer cervical metastático refratário desenvolveu insuficiência respiratória e morreu após receber a combinação do anti PD-L1 da AstraZeneca, durvalumabe (Imfinzi®), com o anticorpo axalimogene filolisbac (ADXS11-001), da Advaxis. A morte foi classificada como Evento Adverso Grave, de Grau 5.
O estudo de Fase I / II estava avaliando a combinação de durvalumabe + ADXS11-001 em pacientes com câncer de colo de útero avançado, recorrente ou refratário, associado ao papilomavírus humano (HPV) e também inscreveu pacientes com câncer de cabeça e pescoço HPV positivo. Agora, o estudo teve o recrutamento suspenso para esclarecimentos sobre os riscos dos participantes da pesquisa (Clinical Trials:NCT02291055).
Em nota, a AstraZeneca destacou que está colaborando com a Advaxis, o FDA e o centro de investigação para analisar e entender o evento em detalhes, assim como dar encaminhamento ao caso da melhor forma possível. Durvalumabe tem a aprovação da Anvisa para o tratamento de carcinoma urotelial localmente avançado ou metastático.
Em julho de 2017, depois de comprovar que mais pacientes haviam morrido no grupo experimental na comparação com o grupo-controle, o FDA também exigiu esclarecimentos dos estudos com pembrolizumabe (KEYNOTE 183 e KEYNOTE 185) em pacientes com mieloma múltiplo (MM)2.
Os estudos com o anti PD-1 pembrolizumabe avaliavam sua combinação com dois imunomoduladores usados para tratar MM, lenalidomida e pomalidomida, habitualmente indicados em associação com dexametasona. No KEYNOTE 185, foram registradas 19 mortes no grupo de pacientes que recebeu pembrolizumabe e lenalidomida com dexametasona, em comparação com 9 do grupo que recebeu apenas lenalidomida e dexametasona. Os dados apresentados após 6.6 meses de follow up mostram que o risco de morte com pembrolizumabe foi mais que o dobro do verificado no grupo controle (HR= 2.06; 95% CI, 0.93-4.55).
A imunoterapia com CAR T Cells, celebrada como o avanço do ano, também despertou a atenção de autoridades reguladoras em 2016, depois de cinco mortes de jovens adultos no estudo ROCKET, da Juno Therapeutics. Um ano depois, o patrocinador veio a público explicar que as altas taxas de edema cerebral observadas com JCAR015 no estudo fase II ROCKET foram atribuídas à rápida expansão de células T modificadas pelo receptor de antígeno quimérico (CAR) e a um aumento nos níveis de interleucina-15 (IL-15).
Os principais fatores associados ao edema cerebral foram idade (<30 anos; odds ratio [OR], 5,16; IC 95%, 0,83-55,93; P = 0,112), tratamento prévio com ≤2 regimes (OR, 7,24; 95% IC, 0.72-980.23; P = .208), quimioterapia intensiva (OR, 4,68; 95% CI, 0,63-32,64; P = 0,133) e linfodepleção de alta intensidade com fludarabina e ciclofosfamida (OR, 7,25; IC95% 1,14-53,98; P = 0,045). “Pacientes que desenvolveram edema cerebral no estudo ROCKET tinham todos esses fatores. São pacientes identificáveis”, esclareceu Mark J. Gilbert, diretor médico da Juno Therapeutics.
Em meio a preocupações com a evolução da pesquisa clínica, está em segundo plano o olhar sobre a segurança do protocolo de pesquisa? Afinal, que caminhos podem melhorar a segurança do paciente participante de pesquisa?
Referências:
1 - Cancer researchers push to relax rules for clinical trials - Heidi Ledford - Nature 556, 12-13 (2018) doi: 10.1038/d41586-018-03355-6