Estudo de pesquisadores do Yale Cancer Center publicado no JAMA sugere que o sequenciamento genômico amplo, avaliando mais de 30 genes, não parece melhorar a sobrevida de pacientes com câncer de pulmão não pequenas células (CPNPC) em comparação com testes genômicos de rotina (definido apenas como EGFR e ALK). “O período de tempo deste estudo é um importante fator limitante dos resultados apresentados, pois muitos dos TKis atualmente aprovados nos EUA não estavam disponíveis”, avalia Marcelo Cruz (foto), oncologista do Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo.
Os pesquisadores analisaram prontuários médicos do banco de dados Flatiron Health de 5688 pacientes com CPNPC avançado tratados em 191 centros de tratamento oncológico nos Estados Unidos entre 1º de janeiro de 2011 e 31 de julho de 2016. Os pacientes foram diagnosticados com CPNPC não-escamoso estádio IIIB/IV ou irressecável, e receberam pelo menos uma linha de tratamento antineoplásico.
O sequenciamento genômico de base ampla incluiu qualquer ensaio de sequenciamento de painel multigênicos examinando mais de 30 genes antes do tratamento de terceira linha. Como teste de rotina os pesquisadores consideraram a análise apenas de mutações EGFR e/ou rearranjos ALK. O endpoint primário foi a mortalidade em 12 meses e a sobrevida global desde o início do tratamento em primeira linha. Os desfechos secundários incluíram frequência de alterações genéticas e tratamentos recebidos.
Resultados
Entre 5688 indivíduos com CPCNP avançado (mediana de idade 67 anos [intervalo interquartil, 41-85], 63,6% brancos, 80% com história de tabagismo), 875 (15,4%) receberam sequenciamento genômico amplo e 4813 (84,6%) receberam testes de rotina. Entre os pacientes que receberam sequenciamento genômico amplo, 4,5% receberam terapia-alvo com base nos resultados dos testes, 9,8% receberam terapia-alvo de rotina com EGFR/ALK e 85,1% não receberam terapia-alvo. As taxas de mortalidade não ajustadas em 12 meses foram de 49,2% para pacientes submetidos a sequenciamento genômico amplo e 35,9% para pacientes submetidos a testes de rotina.
Usando uma análise de variável instrumental, não houve associação significativa entre sequenciamento genômico amplo e mortalidade em 12 meses (probabilidade prevista de morte aos 12 meses, 41,1% para sequenciamento genômico de base ampla vs 44,4% para testes de rotina; diferença -3,6% [95% IC, - 18,4% a 11,1%]; P = 0,63). Os resultados foram semelhantes na análise de sobrevida de escore de propensão (42,0% vs 45,1%; hazard ratio, 0,92 [95% CI, 0,73-1,11]), enquanto a análise de coorte simples encontrou uma vantagem de sobrevida associada ao sequenciamento genômico de amplo (hazard ratio 0,69; P <0,001).
Segundo os autores, os resultados podem ter sido influenciados pela limitação de terapias-alvo limitadas no período em que o estudo foi conduzido, falta de acesso a ensaios clínicos, custo de novos medicamentos, ou recusa de seguros saúde de uso off-label de medicamentos.
Em editorial publicado na edição, o oncologista Paul A. Bunn Jr e a patologista Dara L. Aisner, do University of Colorado Cancer Center, argumentam que o estudo não é conclusivo sobre o papel do sequenciamento genômico amplo no CPNPC não escamoso. “Identificar, mas não tratar os fatores moleculares, não melhora a sobrevida. Essa lacuna entre encontrar e tratar alterações moleculares no cenário clínico destaca a realidade de que a obtenção de mais informação genômica do tumor deve ser complementada com educação clínica e apoio à decisão para entender a importância da terapia combinada”, afirmam.
Além disso, eles observam que TKIs específicos usados na terapia de primeira linha melhoram a sobrevida livre de progressão (SLP), as taxas de resposta objetiva e a qualidade de vida (QOL), reduzindo a toxicidade, desfechos que não foram avaliadas no estudo. “A sobrevida em 12 meses como o único endpoint provavelmente subestima outras formas de benefícios de uma terapia-alvo baseada no sequenciamento genômico amplo”, dizem.
Marcelo Cruz acrescenta que o estudo avaliou dados retrospectivos de pacientes tratados na comunidade, onde o sequenciamento em geral era realizado após 1 a 2 linhas de terapia. “Comparar este cenário com avaliação de rotina do EGFR e ALK e uso de TKis na primeira linha não parece o cenário mais adequado. Importante lembra que na era da imunoterapia o conhecimento de carga tumoral mutacional e de novas alterações gênicas relacionadas com resposta ou resistência a checkpoint inhibitors poderá ser incorporado na decisão terapêutica, sendo este mais um importante motivo para a realização de sequenciamento genômico amplo na prática clínica”, conclui.
O trabalho foi financiado pelo Veterans Affairs/Robert Wood Johnson Clinical Scholars Program e National Cancer Institute Yale Lung SPORE Career Development Award.
Referência: Association of Broad-Based Genomic Sequencing With Survival Among Patients With Advanced Non–Small Cell Lung Cancer in the Community Oncology Setting - Carolyn J. Presley, Cary P. Gross et al - JAMA. 2018;320(5):469-477. doi:10.1001/jama.2018.9824