Subanálise do ensaio RAPIDO publicada por Zwart et al. no European Journal of Cancer é o primeiro relatório que comparou em um ambiente randomizado os resultados oncológicos de pacientes com câncer retal localmente avançado que atingiram resposta patológica completa após terapia neoadjuvante total e após o tratamento padrão. Não foram observadas diferenças estatisticamente significativas em recorrência locorregional e metástases à distância em toda a coorte RAPIDO após 5 anos de acompanhamento, em contraste com relatórios anteriores.
Uma resposta patológica completa (pCR) após quimiorradioterapia (QRT) ou radioterapia de curta duração (scRT) leva a um prognóstico favorável em pacientes com câncer retal. A terapia neoadjuvante total (TNT) duplica a taxa de pCR, mas não se sabe se os resultados oncológicos permanecem favoráveis e se as mesmas características estão associadas à pCR e após a quimiorradioterapia.
Pacientes com diagnóstico de câncer retal localmente avançado (LARC) correm risco de cirurgia não radical, recorrência locorregional e metástases à distância. Para diminuir esses riscos, é administrado tratamento (neo)adjuvante. As diretrizes americanas mais recentes recomendam TNT para LARC como alternativa à radioterapia de curta duração (scRT) ou quimiorradioterapia (QRT) com quimioterapia pós-operatória, e exclusivamente TNT para LARC de alto risco. Pacientes que alcançam pCR após QRT ou scRT demonstram prognóstico superior em relação àqueles com metástases à distância ou recorrência locorregional, assim como obtêm maior sobrevida em comparação com pacientes sem pCR.
Neste estudo, o objetivo foi identificar quando a TNT resulta em pCR e os resultados oncológicos. Zwart et al. compararam pacientes com pCR no estudo RAPIDO nos grupos experimental [EXP] (scRT, quimioterapia, cirurgia, como TNT) e tratamento padrão [STD] (QRT, cirurgia, quimioterapia pós-operatória, dependendo da política do hospital). Os endpoints primários e secundários foram o tempo para a recorrência (TTR), a sobrevida global (SG) e a associação entre características do paciente, do tumor e do tratamento com pCR.
Entre os pacientes com ressecção dentro de seis meses após o tratamento pré-operatório, os autores descrevem que120/423 (28%) do grupo experimental e 57/398 (14%) dos que receberam tratamento padrão alcançaram pCR. Após pCR, as taxas cumulativas de tempo até recorrência e sobrevida global em 5 anos nos braços experimental e padrão foram de 8% vs. 7% (razão de risco 1,04, IC 95% 0,32-3,38) e 94% vs. IC 0,51-3,92), respectivamente.
Além do tratamento EXP (odds ratio 2,70, IC 95% 1,83-3,97), antígeno carcinoembrionário (CEA) pré-tratamento <5, tamanho do tumor pré-tratamento <40 mm e cT2 foram associados a pCR. A distância da borda anal foi a única característica com diferença estatisticamente significativa na associação com pCR entre o tratamento EXP e STD (P interação=0,042). As taxas de pCR não aumentaram com o tempo de tratamento prolongado.
Em síntese, a taxa duplicada de pCR na terapia neoadjuvante em comparação com a quimiorradioterapia resultou em resultados oncológicos semelhantes. Não foram observadas diferenças estatisticamente significativas em recorrência locorregional e metástases à distância em toda a coorte RAPIDO após 5 anos de acompanhamento, em contraste com relatórios anteriores.
“Em nosso estudo, os resultados de sobrevida em 5 anos são semelhantes aos da literatura”, comparam os autores, destacando taxas cumulativas de TTR de 8% (EXP) e 7% (STD), comparáveis aos pacientes que alcançaram pCR após scRT no estudo Estocolmo. As taxas de recorrência locorregional, metástases à distância e SG foram de 0%, 7% e 93% após QRT, em comparação com aproximadamente 0-5%, 7-11% e 85-93% na literatura após QRT ou scRT, respectivamente, descreve a análise. “Além disso, as taxas de pCR de 30% vs. 15% permitem duplicar o número de pacientes com potencial de seguir uma abordagem watch and wait (W&W) visando a preservação retal, quando recebem o tratamento EXP em comparação com o tratamento DST QRT”, observam.
Em relação aos endpoints secundários, a altura do tumor mostrou associação estatisticamente significa com diferença entre os braços de tratamento, indicando que os tumores distais estavam associados a pCR, principalmente após TNT. Outro achado revela que pacientes com tumor cT4 podem ter maiores chances de alcançar pCR com o tratamento EXP (27% vs. 8%), embora as diferenças não tenham sido estatisticamente significativas. “Nossos achados indicam que as características do paciente e do tumor não explicam a taxa duplicada de pCR, ao passo que o tipo de tratamento pode explicar. Recentemente, dados de registro de base populacional indicaram que o aumento da adoção de TNT ao longo do tempo pode ter aumentado as taxas de pCR”, analisam os autores.
A íntegra do artigo original está disponivel em acesso aberto.
Referência: Open AccessPublished:April 06, 2024DOI:https://doi.org/10.1016/j.ejca.2024.114044
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